segunda-feira, 23 de março de 2009

Fuzii, Estela Okabayashi


“Meu pai não gostava de ver os imigrantes desamparados num país com língua e costumes desconhecidos e por isso se empenhou para que eu aprendesse português.”
(Tokiko Okabayashi)


“Não cheguei a freqüentar a primeira escola japonesa de Londrina, fundada em 1933, porque ela foi fechada em pouco tempo, por causa da 2ª Guerra Mundial. Aprendi por curiosidade a língua japonesa em casa.Isso espreitando pela fresta da porta da sala de aula (devido a idade ainda não permitir por ser muito novinha, idade de mais ou menos 5 anos). Meu pai contratou um professor, esvaziou uma sala em casa, criou um quadro-negro e as crianças tinham aulas de japonês ali. Tudo às escondidas.”
(Estela Okabayashi Fuzii)




A professora Estela Okabayashi Fuzii, a primeira nissei nascida em Londrina, 75 anos, guarda na memória e no coração a trajetória de vida ao lado dos pais. A mãe, Tokiko, nasceu em Hokkaido em 28 de janeiro de 1908 e veio para o Brasil com os pais em 26 de outubro de 1918, no navio Sangui Maru, partindo de Nagasaki. A bordo, o clã Ogassawara composto por 50 pessoas. Eles haviam vendido as propriedades no Japão e chegaram ao Brasil com terras adquiridas. Não vieram como imigrantes em busca de prosperidade, mas já fazendo parte da história da imigração sudoeste do Estado de São Paulo. Naquela ocasião, o clã construiu uma escola, tradição das colônias japonesas. “Era uma escola diferente, pois estudavam, além da língua japonesa, a língua portuguesa. Foi a primeira escola da colônia japonesa no Brasil a ensinar o idioma português e nela estudavam não apenas crianças, mas jovens, senhores e senhoras. Isso é preservado até hoje na periferia de Álvares Machado, antigo Brejão, e nesse local tem também um cemitério exclusivamente japonês. Hoje tombado como patrimônio histórico doado pelo clã”, conta a professora Estela.
“Quando o clã veio para o Brasil, organizaram uma festa de despedida em Tóquio, onde estavam presentes nobres como o barão Jiyuuzawa e empresários como Takuma Dan. Nessa festa entregaram à família uma soma em dinheiro que foi aceito com a promessa para a construção de empreendimento social em favor dos imigrantes japoneses. A promessa foi cumprida com a edificação da escola e do cemitério”, ressalta.
Tokiko casou-se com Taichi Sano, em 1930. Como a tradição japonesa permite que quando uma família tem apenas mulheres e precisa dar seguimento ao nome da família através de um filho homem, Taichi Sano (por ter casado com a filha mais velha do casal Okabayashi) assumiu o sobrenome Okabayashi. “Dando assim continuidade à família. Meu pai havia imigrado para o Brasil em 1921. Ele era de Takamatsu-shi Kagawa-Ken. No Brasil, trabalhou na lavoura e numa fazenda onde se fabricava pinga.”
Estela se recorda de tudo que aprendeu com os pais estudiosos. “Durante muitos anos meus pais, Taichi e Tokiko, tiveram comércio em Londrina, na rua Professor João Cândido. E mesmo dotada de boa fluência da língua portuguesa, incomum aos imigrantes, ela exigia que eu e a minha irmã Nair, já falecida, falássemos apenas japonês dentro de casa. Minha mãe era uma mulher de vanguarda e queria que as filhas estudassem. Meu pai me inspirou na leitura. Ele mandava buscar livros em São Paulo só para eu ler”, ressalta.
“Com o fechamento do comércio devido à Segunda Guerra Mundial, meu pai foi contratado pela empresa Anderson Clayton, percorrendo a zona rural na compra de algodão. Depois passou para a compra de grãos para a empresa Neman Sahão”, completa.
Mas o começo de vida do casal Taichi e Tokiko, em Londrina, também não foi fácil. Hábitos, costumes e língua completamente diferentes marcaram uma trajetória de trabalho. “Meus pais lutaram muito, cortavam palmito para o próprio consumo, numa região próxima ao atual Museu.” E continua. “Fui registrada em Jataizinho, mas cresci em Londrina. Fiz a Escola Normal e depois em Curitiba, cursei Pedagogia”, relembra.
Dona de um espírito solidário, dona Tokiko encaminhava e acompanhava os imigrantes doentes para hospitais. “Minha mãe atuava sempre como porta-voz das necessidades dos japoneses junto a instituições. Pouco a pouco as famílias imigrantes foram-lhes confiando as filhas, enquanto trabalhavam na lavoura. Assim, minha mãe fundou, em 1937, a Escola Modelo, internato de formação feminina, que até 1977 ensinou corte e costura, arte, culinária, bordado, ikebana e, sobretudo, ética feminina japonesa.”
Estela é casada com Eloy Fuzii, mãe de Stella Cristina, Myriam Teresa, Márian Elizabeth e Eloy Okabayashi Fuzii. É graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Paraná, Orientação Educativa pela University of London, na Inglaterra, e Tecnologia Educativa, em Buenos Aires, na Argentina. Também é pós-graduada em Latu sensu - Filosofia da Educação pela Universidade Federal do Paraná, Administração em Recursos Humanos e em Tecnologia Educacional. É professora titular da Universidade Estadual de Londrina, aposentada em novembro de 2003. Atualmente colabora junto à Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná como diretora do Departamento de Informação e Apoio ao Dekassegui e assessora do Departamento Internacional, além de participar ativamente da programação do Imin 100 anos em Londrina. Ela recebeu a Comenda Ordem do Tesouro Sagrado Raios de Ouro com Roseta outorgada pela Casa Imperial do Japão. “Fui receber a comenda em Tóquio, na Casa Imperial. Ao todo, éramos apenas 11 pessoas do mundo inteiro recebendo a homenagem. E eu, a única mulher”, comenta.
Dona Tokiko também foi condecorada pelo governo japonês com a Comenda Ordem do Tesouro Sagrado Raios de Ouro e Prata, em 1982. “Para mulheres e de geração seguinte como mãe e filha, é raríssimo o recebimento, pois nem homens ou mulheres de geração consecutiva têm recebido”, diz. Estela observa que a comenda normalmente é indicada por uma entidade, mas, no caso dela, a proposta partiu do consulado geral do Japão do Paraná. “Foi uma grata satisfação, eu não imaginava. Fiquei duplamente honrada”, conclui.

2 comentários:

  1. Minha querida tia tenho orgulho de você, Abraço Fabiano Okabayashi

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  2. Oi. No cemitério de Santo Amaro em São Paulo tem um túmulo família okabayashi. É da sua família?

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