segunda-feira, 23 de março de 2009

INTRODUÇÃO

“Meus ancestrais dominaram o Japão por 2000 anos. E por todo este tempo nós dormimos. Durante meu sono, eu sonhei. Sonhei com um Japão unificado. Um país forte, independente e moderno… E agora estamos acordados. Temos linhas de trem, canhões e roupas ocidentais. Mas não podemos nos esquecer quem somos. Nem de onde viemos.”

Imperador Meiji Mutsuhito (1876)

Adati, Luiz Carlos


“Meu pai foi um exemplo para a comunidade.”
(Yosiko Endo Adati)


“Minha mãe guarda várias recordações do tempo que desfrutou na companhia dos meus avós Ihity e Hanako. E, ao lado do meu pai, Massaru, criou os filhos baseada nos melhores princípios de vida”.
(Luiz Carlos Adati)




O imigrante Ihity Endo deixou a Província de Fukushima em 1918. Era um adolescente em busca de melhores condições de vida, assim como seus pais. Para ele, ainda muito jovem, os dois meses passados em alto-mar era uma aventura que ficaria guardada na memória e no coração por toda a vida.
Ihity Endo casou-se com dona Hanako e fez história em Adamantina, no oeste paulista. “Tanto que há um bairro com seu nome, a Vila Endo, e um busto em uma praça, entre tantas outras homenagens. O nome do meu pai está ligado à própria fundação do município e, por toda a parte, ele é lembrado. Para os adamantinenses, meu pai foi um exemplo. O que mais surpreende em sua história é o fato de ele, apesar de ter começado a trabalhar muito jovem, ter tido uma visão empresarial que poucos imigrantes tiveram, principalmente se for considerada a dificuldade que representava viver em um país com língua e costumes totalmente diferentes”, conta Yosiko Endo Adati, 71 anos, matriarca da família. Ela tem boas lembranças dos pais, que foram exemplo de vida criando os 10 filhos: Nair, Keniti, Maria Yosiko, Katsue, Noboru, Taqueshi, Yukiko, Yaeko, Mary e Gilberto.
Yosiko Endo Adati tinha 16 anos quando seus pais hospedaram, durante uma semana, dois membros da família imperial japonesa com a visita do príncipe Kouchi Outani e sua esposa, a princesa Satoko Outani, irmã mais jovem da imperatriz Nagako, esposa de Hirohito. “Foi em 1952 e marcou para sempre nossa família”, relata.
O casal imperial voltou ao Brasil pouco tempo depois, mas em outra cidade do Estado de São Paulo. “Meu pai havia falecido em meados de 1953, e minha mãe, que foi à recepção oferecida ao casal, foi imediatamente reconhecida. A princesa Satoko pegou nas mãos da minha mãe, perguntou por nós e lamentou a morte do meu pai. Ela quebrou o protocolo ao se levantar e falar com minha mãe”, afirma.
Ihity Endo faleceu em 24 de junho de 1953, aos 49 anos, vítima de um acidente de carro. A morte do imigrante e pioneiro, causou forte abalo à população de Adamantina, onde era muito querido. Para a viúva, dona Hanako, foi uma tragédia dolorosa: ela estava grávida do décimo filho, mas enfrentou com coragem a adversidade. “Foram 40 dias de luto. A família chegou a receber telegrama de condolências do príncipe Outani, datado de 31 de julho de 1953”, conta Maria Endo Adati.
Yosiko Endo Adati nasceu em Duartina. Ela e o marido, Massaru Adati, se casaram em 1956. Vieram para Londrina em 1960. O casal teve seis filhos: Luiz Carlos Ihity, Carlos Aberto Massaru, Elizabeth Yoshiko, Marino Tadashi, Paulo Cezar Akihito e Maria Rosa Katsue.
O engenheiro agrônomo Luiz Carlos Adati, coordenador geral do Imin 100 do Paraná, é também um empresário de sucesso, tendo agregado diversos cargos na sua trajetória profissional. Dinâmico, visionário, ele é sócio diretor do Estacenter Parking e atua em seis Estados: Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, desde 1991. Além disso, Adati exerceu as funções de presidente do Conselho Municipal de Turismo, diretor da Associação Comercial e Industrial de Londrina, diretor da Codel Turismo, diretor regional da Câmara de Comércio Brasil-Japão do Paraná , vice-presidente da Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná. Foi diretor da Associação Cultural e Esportiva de Londrina e vice-presidente da Associação Brasileira dos Estacionamentos. Casado com a psicóloga Ione Taki Adati, é pai de Lucas e Luís Augusto.
Conhecedor de diversas culturas, Luiz Carlos Adati esteve na comitiva de Missões Econômicas ao Japão e Ásia por cinco vezes. No Japão, esteve representando o Paraná como líder nikkey no Programa Ministério das Relações Exteriores, representando o prefeito de Londrina na cidade de Nishinomiya e na cerimônia oficial das comemorações do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, realizada em Tokyo e Kobe.

Egashira, Miyoshi


“Eu era adolescente e meu pai falou algo que ficou gravado na mente e no coração. Depois de ver Tóquio destruída e queimada por causa da guerra, em 1950, alertou que todos nós deveríamos ter uma atitude útil à sociedade. Que deveríamos semear coisas boas porque um dia elas iriam brotar.”
(Miyoshi Egashira)




O senhor Miyoshi Egashira irá completar 74 anos. Mas aparenta menos idade e é dono de uma vitalidade admirável. Há muitos anos dispensou o carro, faz diariamente sua caminhada, é faixa preta em judô e kendô, acorda cedo, faz seu ritual de concentração e aos domingos cozinha para toda a família. E tem uma memória ótima. Filho de Yoshico e Taneo Egashira, ele tem boas recordações da família, que durante muitos anos trabalhou na região de Lins, no interior paulista.
A saga da família Egashira se confunde com a história de centenas de imigrantes japoneses que aportaram no Brasil em busca de prosperidade. “Meu pai veio com os meus avós para o Brasil quando tinha apenas 11 anos. Eles chegaram ao Porto de Santos na manhã de 20 de abril de 1917, vindos da Província de Saga-Ken. Meus avós Haya e Taichi Egashira embarcaram com os filhos no navio a vapor Wakasa Maru. “Era um cargueiro com 70 toneladas”, conta Miyoshi, segundo filho do casal Egashira.
No Brasil foram levados de trem à região Mogiana. Depois de permanecerem 5 anos na Fazenda Buenópolis, na cidade de Cravinhos, mudaram-se para Catanduva e depois para Lins, onde os pais de Miyoshi viriam a se casar. “Após 10 anos de vida de colono, a família Egashira conseguiu comprar 30 alqueires de terra na Colônia Aliança”, recorda. “Dois anos depois, meu pai compraria seu primeiro caminhão. Com a revolução de 1930 o caminhão foi confiscado.E foi devolvido para ele em 1934, mas apenas o motor e o chassi. Meu pai acabou vendendo para dar entrada em 20 alqueires na Gleba Bandeirantes, em Rolândia. Naquela época éramos eu, meu irmão mais velho e meus pais”, completa. Mais tarde o local foi batizado pelo próprio Taneo, com o nome de Colônia Kyoei, que significa “Progresso com Unidade’’.
Taneo Egashira foi um dos fundadores de Rolândia, fundador do Rotary Club daquela cidade e primeiro imigrante a ser presidente rotário, em 1961. A família prosperou e teve fazenda em Paranavaí. Sempre preocupado em dar os melhores estudos aos filhos, Hatsuyo, Sussumu, Yaeko, Iwao, Yoiti, Yoshitane, Takatoshi, Massaru e Miyoshi, o imigrante Taneo trabalhou incansavelmente deixando um legado de honestidade e dedicação. “Admiro muito meus pais. Todos os filhos tiveram a formação do curso secundário e quatro formaram-se no curso superior”, relata.
Saudosista, Miyoshi Egashira relembra os anos passados na fazenda de café quando, ainda criança, ajudava os pais no trabalho da lavoura. “No setentrião paranaense, cercado pela densa floresta tropical, passei a infância descalço, sem muita comodidade e convivendo com as adversidades da natureza. Com 13 anos, na época áurea do café, pude me mudar para Londrina a fim de estudar. Na época, ainda existia o resquício da 2ª Guerra Mundial. Eu ouvia constantemente as palavras discriminatórias, apesar de ter nascido no Brasil. Foi um tempo difícil para os japoneses”, recorda. Em 1958, após concluir o curso colegial, Miyoshi foi para Curitiba onde fez o curso de Economia. “Mas durante o curso eu trabalhei como desenhista, projetista, jardineiro, tipógrafo, impressor, professor de língua japonesa, decorador, motorista de Kombi e fui admitido numa empresa de Organização e Sistematização de Empresas. Em 1961, fui nomeado tradutor público juramentado.”
Em 1964 ele casa-se com a professora Hisako. “Em 1963 eu havia feito uma prova seletiva para intérprete bilíngüe da Empresa Usiminas e fui aprovado. Mas, como já trabalhava na empresa de organização e com casamento marcado para janeiro do ano seguinte, permaneci em Curitiba. E sempre fiz questão de me especializar, estudar, aprender. Retornei a Londrina em 1966, quando o então deputado federal Antonio Ueno me pediu para organizar uma financeira, a Paranacrédito S.A – Financiamento, Crédito e Investimento. Depois fundei a Distribuidora Nikkei e fui sócio gerente da Farmácia Sergipe, Restaurante San Remo, LC Cosméticos Ltda. e trabalhei na construção e organização do Hotel Nikkey e Restaurante Tsubaki, em São Paulo.”
Tendo viajado várias vezes para os Estados Unidos, Europa e Japão, quando participava de seminários internacionais, Miyoshi fez um curso de orientação e treinamento na área da Medicina Preventiva e Assistência ao Idoso. “Isso foi em 1983, quando viajei a convite do governo do Japão. Depois que retornei, percorri todo o rincão paranaense para contar com as Associações Nipo-brasileiras e implantar o sistema de Medicina Preventiva no Paraná. Cheguei a viajar mais de 50 mil quilômetros em 10 anos, com uma equipe de 40 pessoas, entre médicos, bioquímicos, fisioterapeutas, nutricionistas, laboratoristas e enfermeiras. Foi um trabalho árduo, mas extremamente gratificante”, comenta.
Por mais de 20 anos foi diretor da ACEL – Associação Cultural e Esportiva de Londrina e atualmente é representante da Cidade de Nishinomiya, no convênio de cidade co-irmã entre Londrina e Nishinomiya. E é membro consultivo da Aliança Cultural Brasil Japão do Paraná. Hisako e Miyoshi tiveram duas filhas: Denise, casada com Mário. Ambos são funcionários públicos. Sandra é psicóloga, atua em clínica e como consultora de recursos humanos. É casada com Marcelo, que dirige um bar restaurante em Londrina. “Temos três netos, Amanda, com 8 anos, João Pedro, 4 anos, e Vivian, 1 ano e meio”, conta orgulhoso.
Como lazer, Miyoshi reúne a família aos domingos e faz questão de cozinhar. “Faço de tudo um pouco e tenho prazer em ver minha família reunida. Lembro que minha mãe cozinhava para o meu pai e todos os filhos homens, numa época dura da lavoura, sem regalias. Eu ajudava minha mãe e aprendi com ela a preparar pratos japoneses. Na verdade, cozinhar me faz muito bem. É como uma terapia”, conclui.
Taneo Egashira faleceu em 1988, com 82 anos. Trabalhou incansavelmente em prol da comunidade e em abril de 1978, ano comemorativo dos 70 anos da imigração japonesa, foi agraciado com uma Comenda do Imperador do Japão “Kyokujitsusho”, que significa “Ordem do Sol Nascente”. Dona Yoshico faleceu em 1987.

Fukushima, Massanori


“A família Fukushima agradece à colônia japonesa de Arapongas e do Paraná pelo privilégio de poder servir. E agradecemos com alegria, a honra de receber a Comenda do Imperador do Japão, em 1995.”
(Masato Fukushima)


Ele deixou a Província de Fukuoka, no Japão, ao lado dos pais, para tentar novos horizontes num país totalmente diferente do seu, com hábitos, costumes, comida e idioma nunca antes vistos. Durante muitos anos a família dedicou-se ao trabalho na lavoura. E aos poucos eles foram conquistando estabilidade financeira, se tornaram prósperos e adotaram o Brasil como o país do coração. Em Arapongas fixaram residência e se tornaram uma das famílias mais tradicionais daquela cidade.
Masato Fukushima nasceu em 12 de dezembro de 1924 e imigrou com a família para o Brasil, em 1935. De Santos, eles seguiram para Presidente Bernardes, no interior de São Paulo, sempre tendo como atividade principal a plantação de algodão. Em 1948 a família mudou-se para Arapongas, no Norte do Paraná. “Eu e a minha esposa, Shizuki Tagawa, tínhamos o primeiro filho, Massanori, com apenas um mês de vida. Durante 6 meses eu trabalhei como aprendiz na Casa Verde, no ramo de secos e molhados, de propriedade do senhor Shigueru Nakagawa, e que ficava ao lado do Tabelionato Grassano. Em 1949, eu me estabeleci no ramo, à frente da Casa do Povo, situada na Avenida Arapongas, 1302. Com trabalho incansável, honestidade e bom atendimento, conseguimos uma grande clientela. A convite do senhor Shigueru, comecei a freqüentar as reuniões da Associação Japonesa. Em 1960 iniciei uma nova atividade de benefício de arroz, a Máquina São Paulo, na rua Tangará, 43”, relembra o imigrante Masato.
Foi em 1974, que Masato Fukushima ampliou horizontes, com o comércio de compra e venda de cereais e industrialização de milho branco e secagem. Ao lado dos filhos Massanori e Nelson, abriu a firma Fukushima Alimentos Ltda. “Fomos prosperando e adquirimos terras em Arapongas, plantando 60 mil pés de eucaliptos, 40 mil pés de kiri. Tivemos granja, suínos, criação de coelhos e frango de corte”, comenta.
Masato e Shikuzi tiveram sete filhos: Massanori, Alice Harumi, Luzia Kiyomi, Catarina Shizuka, Nelson Massaharu, Elza Mayumi, Celina Terumi.
Várias funções e cargos o imigrante Masato ocupou ao longo de todos esses anos. Atuou na Associação Japonesa, fundou a Acear, onde foi presidente durante sete gestões. Coordenou eventos esportivos e a exposição agrícola, foi vice-presidente da Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná, vice-presidente da Província de Fukuoka no Brasil e presidente da Província de Fukuoka em Arapongas. É membro do Rotary Club de Arapongas desde 1980, presidente do Sindicato Rural de Arapongas. Participou na coordenação dos 70 anos da imigração japonesa. Em 1988, durante as comemorações dos 80 anos de imigração, foi o coordenador geral dos eventos. Em 1998, nos festejos de 90 anos da imigração, continuou se empenhando ativamente, auxiliando na coordenação, recepcionando diversas autoridades tanto do Brasil como do Japão. Há 51 anos atua na diretoria da Liga Desportiva Norte do Paraná, atualmente, Liga Desportiva Cultural Paranaense. Recebeu homenagens, entre elas, a “Honra ao Mérito”, concedida pelo governador Hirako Kamei, da Província de Fukuoka. A mesma honraria lhe foi dada pela Liga Desportiva Norte do Paraná e outra, concedida pela Associação da Criança Excepcional do Brasil. Também foi agraciado com a “Honra ao Mérito” concedida pelo ministro de Relações Exteriores, Munussuke Ono, na ocasião dos 90 anos da imigração japonesa. Em 1990, foi ao Japão para receber a homenagem do governador de Fukuoka, Sr. Yassuo Okuta, tendo participado das solenidades dos Jogos Abertos do Japão. Foi “Cidadão Honorário de Arapongas” e recebeu a “ Comenda de Sol Nascente de Raios Dourados”, dada pelo imperador do Japão, essa, motivo de muito orgulho para um imigrante japonês.
O casal Masato e Shikuzi completou 50 anos de casados, em 1997. Eles tem 15 netos.

Furuta, Antonio Tomio


“Meus pais eram feirantes. Aprendi tudo com eles, acordando muito cedo, observando a luta deles, o empenho no dia-a-dia. Meu pai montou aquele box no Mercado Municipal para mim. Tem 40 anos e é de lá que sempre tirei o sustento para a minha família. A mesma vontade de trabalhar meu pai herdou do meu avô, Hissokit Furuta, que chegou no Brasil em 1914. E foi direto para a lavoura.”
(Antonio Furuta)



Pode-se afirmar que Antonio Furuta é um homem de sucesso. Um empresário dinâmico, trabalhador, conhecedor do assunto. Há 40 anos comanda o negócio iniciado pela família no Mercado Municipal. “Naquela época, em 1968, o prédio estava abandonado e o prefeito Hosken de Novaes doou um box para cada feirante. Meu pai abriu uma portinha e começou a vender frutas, verduras. Não havia supermercado e nós acabamos virando uma mercearia para atender os clientes”, conta. O tino comercial estava no sangue e, aliado à experiência adquirida com o pai, Antonio dedicou-se ao negócio, que foi crescendo, criando um perfil próprio, conquistando clientes, tornando-se uma referência regional na oferta de gêneros alimentícios importados. Hoje, ele é o protagonista de uma história de sucesso que teve início com a chegada de seu avô paterno, Hissokit Furuta, em 1914, quando aportou em Santos e foi trabalhar na lavoura na região Mogiana, em São Paulo. “Meus avós vieram jovens, ambos com 20 anos, casados e tiveram todos os filhos aqui. Meu pai, Massaji Furuta, nasceu em Assaí e lá fez a vida ao lado da minha mãe, Kiyoko. Somos 8 irmãos: Meire, Luiza, Mário, Antonio, Luiz, Milton, Roberto e Mauro. Quando estávamos em idade escolar nos mudamos para Londrina. Até os 10 anos nós só falávamos em japonês com meus pais. Eles faziam questão e ninguém desobedecia porque meu pai era direto, de pouca conversa, dedicado somente à família”, relembra Antonio. A família Furuta é proveniente da Província de Fukuoka que é banhada pelo mar por três lados, além de fazer fronteira com as províncias de Saga, Oita e Kumamoto. A província inclui as duas maiores cidades de Kyushu: Fukuoka e Kitakyushu, concentrando em si as principais indústrias da região. ‘É uma região bonita, minha mãe já esteve lá por duas vezes e meu pai viajou para rever os parentes uma vez. Eu também já estive lá. Mas nada se compara ao Brasil”, ressalta. Antonio lembra-se do pai acordando nas primeiras horas da madrugada para ir trabalhar. “Não tinha descanso. Se chovia e não dava para trabalhar na lavoura, meu pai cortava lenha. Quando eu fiz 18 anos, aposentei meu pai e fui trabalhar com meu irmão. Ele fazia a feira e eu ficava no Mercado Municipal. Herdei a mesma vontade de trabalhar do meu pai. Nunca tive preguiça para nada.” Viúvo, pai de uma única filha, Antonio Tomio Furuta é membro da Igreja Perfeita Liberdade. A mãe é viva, atuante na igreja, tem 13 netos. O pai faleceu com 56 anos, de um infarto fulminante. “Foi muito duro. Meu pai era muito ativo, participante. Eu tenho boas lembranças dele”, conclui.

Fuzii, Estela Okabayashi


“Meu pai não gostava de ver os imigrantes desamparados num país com língua e costumes desconhecidos e por isso se empenhou para que eu aprendesse português.”
(Tokiko Okabayashi)


“Não cheguei a freqüentar a primeira escola japonesa de Londrina, fundada em 1933, porque ela foi fechada em pouco tempo, por causa da 2ª Guerra Mundial. Aprendi por curiosidade a língua japonesa em casa.Isso espreitando pela fresta da porta da sala de aula (devido a idade ainda não permitir por ser muito novinha, idade de mais ou menos 5 anos). Meu pai contratou um professor, esvaziou uma sala em casa, criou um quadro-negro e as crianças tinham aulas de japonês ali. Tudo às escondidas.”
(Estela Okabayashi Fuzii)




A professora Estela Okabayashi Fuzii, a primeira nissei nascida em Londrina, 75 anos, guarda na memória e no coração a trajetória de vida ao lado dos pais. A mãe, Tokiko, nasceu em Hokkaido em 28 de janeiro de 1908 e veio para o Brasil com os pais em 26 de outubro de 1918, no navio Sangui Maru, partindo de Nagasaki. A bordo, o clã Ogassawara composto por 50 pessoas. Eles haviam vendido as propriedades no Japão e chegaram ao Brasil com terras adquiridas. Não vieram como imigrantes em busca de prosperidade, mas já fazendo parte da história da imigração sudoeste do Estado de São Paulo. Naquela ocasião, o clã construiu uma escola, tradição das colônias japonesas. “Era uma escola diferente, pois estudavam, além da língua japonesa, a língua portuguesa. Foi a primeira escola da colônia japonesa no Brasil a ensinar o idioma português e nela estudavam não apenas crianças, mas jovens, senhores e senhoras. Isso é preservado até hoje na periferia de Álvares Machado, antigo Brejão, e nesse local tem também um cemitério exclusivamente japonês. Hoje tombado como patrimônio histórico doado pelo clã”, conta a professora Estela.
“Quando o clã veio para o Brasil, organizaram uma festa de despedida em Tóquio, onde estavam presentes nobres como o barão Jiyuuzawa e empresários como Takuma Dan. Nessa festa entregaram à família uma soma em dinheiro que foi aceito com a promessa para a construção de empreendimento social em favor dos imigrantes japoneses. A promessa foi cumprida com a edificação da escola e do cemitério”, ressalta.
Tokiko casou-se com Taichi Sano, em 1930. Como a tradição japonesa permite que quando uma família tem apenas mulheres e precisa dar seguimento ao nome da família através de um filho homem, Taichi Sano (por ter casado com a filha mais velha do casal Okabayashi) assumiu o sobrenome Okabayashi. “Dando assim continuidade à família. Meu pai havia imigrado para o Brasil em 1921. Ele era de Takamatsu-shi Kagawa-Ken. No Brasil, trabalhou na lavoura e numa fazenda onde se fabricava pinga.”
Estela se recorda de tudo que aprendeu com os pais estudiosos. “Durante muitos anos meus pais, Taichi e Tokiko, tiveram comércio em Londrina, na rua Professor João Cândido. E mesmo dotada de boa fluência da língua portuguesa, incomum aos imigrantes, ela exigia que eu e a minha irmã Nair, já falecida, falássemos apenas japonês dentro de casa. Minha mãe era uma mulher de vanguarda e queria que as filhas estudassem. Meu pai me inspirou na leitura. Ele mandava buscar livros em São Paulo só para eu ler”, ressalta.
“Com o fechamento do comércio devido à Segunda Guerra Mundial, meu pai foi contratado pela empresa Anderson Clayton, percorrendo a zona rural na compra de algodão. Depois passou para a compra de grãos para a empresa Neman Sahão”, completa.
Mas o começo de vida do casal Taichi e Tokiko, em Londrina, também não foi fácil. Hábitos, costumes e língua completamente diferentes marcaram uma trajetória de trabalho. “Meus pais lutaram muito, cortavam palmito para o próprio consumo, numa região próxima ao atual Museu.” E continua. “Fui registrada em Jataizinho, mas cresci em Londrina. Fiz a Escola Normal e depois em Curitiba, cursei Pedagogia”, relembra.
Dona de um espírito solidário, dona Tokiko encaminhava e acompanhava os imigrantes doentes para hospitais. “Minha mãe atuava sempre como porta-voz das necessidades dos japoneses junto a instituições. Pouco a pouco as famílias imigrantes foram-lhes confiando as filhas, enquanto trabalhavam na lavoura. Assim, minha mãe fundou, em 1937, a Escola Modelo, internato de formação feminina, que até 1977 ensinou corte e costura, arte, culinária, bordado, ikebana e, sobretudo, ética feminina japonesa.”
Estela é casada com Eloy Fuzii, mãe de Stella Cristina, Myriam Teresa, Márian Elizabeth e Eloy Okabayashi Fuzii. É graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Paraná, Orientação Educativa pela University of London, na Inglaterra, e Tecnologia Educativa, em Buenos Aires, na Argentina. Também é pós-graduada em Latu sensu - Filosofia da Educação pela Universidade Federal do Paraná, Administração em Recursos Humanos e em Tecnologia Educacional. É professora titular da Universidade Estadual de Londrina, aposentada em novembro de 2003. Atualmente colabora junto à Aliança Cultural Brasil-Japão do Paraná como diretora do Departamento de Informação e Apoio ao Dekassegui e assessora do Departamento Internacional, além de participar ativamente da programação do Imin 100 anos em Londrina. Ela recebeu a Comenda Ordem do Tesouro Sagrado Raios de Ouro com Roseta outorgada pela Casa Imperial do Japão. “Fui receber a comenda em Tóquio, na Casa Imperial. Ao todo, éramos apenas 11 pessoas do mundo inteiro recebendo a homenagem. E eu, a única mulher”, comenta.
Dona Tokiko também foi condecorada pelo governo japonês com a Comenda Ordem do Tesouro Sagrado Raios de Ouro e Prata, em 1982. “Para mulheres e de geração seguinte como mãe e filha, é raríssimo o recebimento, pois nem homens ou mulheres de geração consecutiva têm recebido”, diz. Estela observa que a comenda normalmente é indicada por uma entidade, mas, no caso dela, a proposta partiu do consulado geral do Japão do Paraná. “Foi uma grata satisfação, eu não imaginava. Fiquei duplamente honrada”, conclui.

Fuzioka, Tero


‘‘Quando eu era criança, ajudava meu pai na lavoura. Ele adquiriu uma propriedade de 30 alqueires em Araçatuba e eu me recordo o dia em que pela primeira vez vi um avião. Eu tinha 6 anos e fiquei encantado.’’
(Tero Fuzioka)


‘‘No Brasil, quando morávamos no sítio, meus pais nos trancavam em casa porque tinham medo que os mascates nos levassem embora.”
(Kazumi Fuzioka)




Eles eram jovens na época. Mas gravaram na memória cada apito do vapor Wakassa Maru, as escadas do navio, as brincadeiras a bordo. Traziam junto à pouca bagagem, entusiasmo e esperança. Com o passar dos anos tiveram que conviver com as desventuras e as decepções sofridas em solo brasileiro. Miyono e Akira Miyazaki casaram-se no Japão para vir ao Brasil. Ambos eram provenientes da Província de Kumamoto e aportaram em Santos em 26 de maio de 1913. O filho Tero Fuzioka conta a trajetória da família: “Meu pai levou o sobrenome da minha mãe porque na família dela havia apenas mulheres. Queriam dar continuidade ao sobrenome. O Miyazaki era herança da minha mãe, mas o sobrenome original do meu pai é Fuzioka. Igual ao meu’’.
Quando Tero Fuzioka nasceu, em 1º de fevereiro de 1929, a pessoa encarregada de fazer o registro era um amigo do senhor Akira. “Eles eram amigos desde a época de solteiros e conhecia meu pai apenas por Fuzioka. Aí ele ficou de me registrar Tero Fuzioka. Mas aconteceu uma coisa engraçada. Eu fui registrado apenas com o primeiro nome – Tero – e me tornei de fato Fuzioka quando cursava o primário e o professor acrescentou por conta própria. Sou o único da família a ter o sobrenome original do meu pai. Meus pais tiveram 15 filhos. Eu sou o sétimo filho e tenho 79 anos”, completa.
Chegando ao Brasil, o casal Miyono e Akira foi enviado a Birigüi, no interior de São Paulo. A família adquiriu um sítio de 7 alqueires e plantava café, depois mudou-se para Araçatuba. “Até os 11 anos eu morei no sítio e freqüentava a escola de lá. Mas foi em 1941 que eu fui para São Paulo continuar meus estudos. Eu trabalhava de manhã e estudava à tarde. Fui morar num internato, fiz curso de contabilidade na Faculdade de Santana e Escola Técnica do Comércio. Meus irmãos e pais continuaram trabalhando na lavoura até 1948. Depois se mudaram para Piacatu, próximo à cidade de Bilac, no interior paulista. Eu saí de casa em 1941 e nunca mais voltei. Fui para Maringá em 1952 onde me casei com Kazumi e lá residimos durante 17 anos”, conta.
Kazumi, filha de Yassube e Taneko Kague, tinha um salão de beleza e Tero trabalhava no comércio. Tiveram 3 filhos, Áurea, Alberto e Alcides, 10 netos e 3 bisnetos. “Meu pai morreu em 1971 com 73 anos. Eu trabalhei em Maringá, depois em Umuarama, numa empresa de ônibus. Graças a Deus tive condições de dar bons estudos para os meus filhos. Trabalhei em Umuarama até me aposentar em 1984.”
O casal atualmente reside em Londrina e adora pescar. “É meu passatempo preferido. Eu costumo pescar no Pesque Pague ou Rio Paraná. Também trabalhei na Associação Cultural Esportiva de Umuarama. Quando meu filho Alberto, que é médico, terminou a residência, optou por Londrina, onde viemos morar. A gente preserva a família, gostamos de estar juntos. Adoramos a companhia dos netos”, revela.
Kazumi e Tero casaram-se em 16 de outubro de 1958. Ela sempre foi dona de casa e conta que a mãe, no Japão, trabalhava como fotógrafa. Recorda que a mãe relatava sobre a vida difícil junto à lavoura e as primeiras impressões que a família teve ao desembarcar em Santos. “Minha mãe contava que ao entrarem no trem que os levaria para as fazendas na região Mogiana, ganhavam mortadela. Os japoneses nunca tinham visto aquilo e não suportavam o cheiro. E acabavam jogando tudo pela janela”, conta Kazumi, que criou os filhos na igreja católica, não tem oratório budista em casa, mas continua a tradição dos pais servindo comida japonesa e falando o idioma japonês. “Mas meus netos reclamam da comida japonesa. Os filhos gostam. Então eu tenho que fazer de tudo um pouco para agradar a todos”, conclui.